Friday, July 31, 2015

A abominável e tenebrosa "Indústria de Multas"

De tempos em tempos, sinto que o Face se transforma num repositório de mimimi, aí eu preciso dar uma fugida pra cá, para espairecer um pouco. Hoje é um desses dias. Tava froids lá pelo Face, precisei sair de casa algumas vezes e pronto: foi o suficiente pra eu me engasgar.

Esta foi uma semana recheada de salas de espera. Numa dessas, leio uma reportagem de um dos jornais locais sobre a instalação de sensores em duas importantes vias do Recife, buscando inibir excesso de velocidade, fechamento dos cruzamentos, avanço de sinal, parada sobre a faixa de segurança, entre outras infrações. E, claro, meu lado masoquista não resistiu e fui ler a página de comentários. Ainda bem que não tava de estômago cheio, mandaria um raulzão na certa. Não demorou muito para a expressão "indústria de multas" povoar um sem-número de comentários. E, mais uma vez, uma equação que nunca fecha se desenhou na minha cabeça: se você não infringe, por que haveria de temer multas?

Vamos lá: a gente sabe que a gestão das nossas vias deixa muito a desejar, que a carga tributária não é diretamente proporcional às melhorias das nossas estradas, a segurança pública tá um f*rico e, o mais grave, que o problema não está circunscrito à esfera da ineficiência, mas também da ética. Parece coerente falar em "indústria de multa" quando a gente se depara com N relatos de multas indevidas (que, como nunca me aconteceu, nem sei como funciona, nem tenho argumentos para julgar).

Mas e o cidadão? Onde ele vive? De que se alimenta? Pois é. Sempre que essas discussões intermináveis rolam, eu fico me perguntando como o cidadão se vê nesse emaranhado de agentes. Ou você acha que o carro se liga e sai andando pelas vias públicas à revelia dos seus proprietários? Por enquanto, um condutor é imprescindível (tem umas tecnologias aí, né?). E quem é esse condutor? E mais: como você se vê enquanto condutor?

A minha reação quando eu soube que instalariam mais um mói de sensor da "indústria de multas" foi: ok, próxima notícia. Porque me parece tão óbvio que a multa é uma punição por infração, logo quem não infringe ___________ (complete a sentença da forma que julgar mais coerente). Você poderia argumentar que, sim, multas indevidas chegam à casa do condutor (e, claro, isso é um aspecto disfuncional), mas você quer me dizer que todas as multas que chegam à casa do condutor são indevidas, fruto de corrupção, "se-colar-colou"? Você quer argumentar que as estatísticas sobre acidentes motivados por excesso de velocidade, ultrapassagem de semáforos e atos de imprudência diversos são invenção da cabeça mirabolante do Poder Público? Você sustenta o argumento de que, se você respeita os limites de velocidade da via, respeita sinalização e conduz com prudência, a instalação desses sensores vai mudar algo na sua vida?

Pois bem, eis o que esses sensores mudarão na minha rotina: NA-DA. Não se trata de lamber o próprio saco e pagar de cidadã exemplar, porque eu odeio isso (e tô longe disso), mas como cidadã sempre me pareceu cretino que eu precise ser vigiada para cumprir aquilo que é tão-somente meu dever. Por isso, sensor nunca afetou minha vida... Okay, me sinto incomodada com a instalação de sensores em determinados sinais com histórico de assalto, mas penso que avançar sinais nessas vias não deveriam ser a solução, mas, sim, rever a segurança nesses locais. Ou seja: cobrar ações efetivas de segurança, em vez de cobrar o fim da "indústria de multas".

Isso não significa que estou passando a mão na cabeça do Poder Público e legitimando as sandices que têm operado nas nossas vias, mas acho que não custa pedir encarecidamente que toda vez que você vir o trânsito parado, "indústria da multa" crescendo e oprimindo cidadãos de bem que sempre respeitam os limites de velocidade, coloque-se na posição de cidadão e pergunte-se em que está contribuindo pra essa m**** toda.

Pra finalizar, ontem à tarde tava indo ao médico (de busão, porque eu não tô feito corno pra ir àquele balaio de gatos que é Ilha do Leite de carro e ficar mendigando um espaço pra estacionar) e atravessei uma das vias com facilidade porque ela estava completamente parada. Olhei para a frente e percebi que o sinal estava verde, mas ainda assim os carros não circulavam. Mais adiante (eu andava, eles não), percebi que, quando o sinal da transversal ficava amarelo, os carros, em vez de parar, aceleravam e, com isso, fechavam o cruzamento. O trânsito no Recife é assim: cada um que salvaguarde seu c* em detrimento dos outros. Com isso, o sinal fechava, mas o cruzamento estava fechado, e a outra via não avançava nunca. Pensei: seriam esses mesmas pessoas que fecham o cruzamento sem o menor peso de consciência que reivindicam o fim da indústria de multas? Pois meus mais sinceros votos de: multa nelas! E muita, pra deixar a canalhice de lado. E só um toque: se não existissem ladrões, não existiriam cadeados. Pense nisso antes de esbravejar contra o próximo avanço da indústria de multas...